Imagine estar sentado na mesa de sua casa, tomando seu café da manhã e pensando sobre como será seu dia. Então, você olha para a janela para saber como está o tempo e imediatamente, sobre a mesa, aparecem projetadas as informações sobre o clima, sem que você precise apertar um botão ou conversar com uma assistente virtual. É como se lessem seu pensamento. Achou futurista demais? Pois saiba que isto não está muito longe de se tornar realidade.
Este é um cenário que será possível com a implantação da próxima geração de Comunicações Móveis, o 6G, cujas pesquisas já estão fervilhando em todo o mundo. “Os conceitos e casos de uso previstos para as redes 6G extrapolam o sentido de comunicação, vão muito além. Essa nova rede vai fazer uma integração do mundo real com o mundo virtual e vamos ter uma sobreposição, uma interligação dessas diferentes realidades dando para as pessoas uma espécie de sexto sentido. É como se a pessoa tivesse uma presença única nesses vários ambientes. Vamos interagir com as coisas de forma muito mais natural, mais intuitiva. O smartphone vai ser coisa do passado”, explica o professor Luciano Leonel Mendes, coordenador do xGMobile - Centro de Competência EMBRAPII Inatel em Redes 5G e 6G.
Essa nova rede vai fazer uma integração do mundo real com o mundo virtual e vamos ter uma sobreposição, uma interligação dessas diferentes realidades dando para as pessoas uma espécie de sexto sentido. É como se a pessoa tivesse uma presença única nesses vários ambientes. Vamos interagir com as coisas de forma muito mais natural, mais intuitiva.
O professor revela que, para que esse tipo de interação seja possível, será fundamental a criação e o desenvolvimento das interfaces cérebro-máquina. “Conseguimos ver hoje o início dessa tendência com o uso da voz para se comunicar com dispositivos inteligentes por meio de assistentes virtuais como Alexa, SIRI, Cortana. Esse é um pequeno vislumbre de como será isso no futuro.
Já se fala em dispositivos biológicos capazes de detectar padrões cerebrais e usar isso para transmitir a mensagem que você quer para a rede. Isso vai abrir um leque para diversas aplicações usando as chamadas comunicações táteis. Hoje conseguimos transmitir voz e imagem, mas imagine se fosse possível também transmitir sensações e emoções”, exemplifica.
Construindo uma “skynet”!?
Segundo ele, a Inteligência Artificial terá um papel crucial para viabilizar todas essas inovações. “Ela será consumida como um serviço da rede, então irá permear todas as camadas das ações de controle em diversos níveis. Ela será transversal nessa rede como um todo”. E as aplicações serão inúmeras, não só no nosso cotidiano, mas também na área industrial.
“A ideia é que a rede possa gerar um gêmeo digital da indústria para que seja possível simular, nesse ambiente virtual, tudo aquilo que vai acontecer ao longo do processo produtivo. Será possível prever problemas, sem que haja pessoas por trás disso. Hoje, com o 5G, surgiram ferramentas que facilitam a tomada de decisões. Com o 6G, a própria rede tomará decisões que nós não somos capazes de tomar.”
Essa autonomia da rede é o grande diferencial da 6ª geração de Comunicações Móveis, de acordo com o professor. “Se olharmos para o passado, veremos que as gerações pares sempre vêm aprimorar as gerações ímpares. A primeira geração foi a que introduziu os serviços de voz, mas foi na segunda que esse serviço foi popularizado. A terceira geração introduziu o sistema de internet, mas era ruim, precário. Aí veio a quarta geração e levou de fato a internet para todos de forma confiável. Agora, a quinta geração está abrindo uma série de serviços, mas é natural que alguns deles não atinjam seu potencial máximo de impacto. A tendência é que a Rede 6G dê um passo além e faça esse laço entre essas várias outras aplicações. Existe ainda a possibilidade da Rede 6G ser a solução definitiva, autoevolutiva, inteligente, autônoma, que vai permear de inteligência tudo aquilo que nos cerca e, com isso, tomar o rumo evolutivo por si só. Então, essa pode ser a última rede que possamos vir a projetar. A evolução dela poderá ser um projeto da própria rede”, destaca.
Tudo estará conectado
E para dar suporte ao funcionamento dessa nova rede autossuficiente, a infraestrutura também deverá ser inovadora, diferente de tudo que já vimos até hoje, explica Luciano. “Os números tendem ao extremo. Ou irão crescer ao extremo, ou irão diminuir ao extremo. Latência será mais baixa, taxa de transmissão mais alta. Mas esse não é o problema. Hoje temos alta vazão ou temos baixa latência, mas na rede 6G teremos que ter alta vazão e baixa latência. Tenho que mandar pra rede tudo o que estou vivendo e receber da rede em tempo real as informações complementares para que possam ser sobrepostas a minha realidade. E como vamos atender isso? É claro que a infraestrutura tem que ser completamente diferente. Nada que usamos até hoje vai atender a uma demanda dessas. Estamos falando de trabalhar com frequências da ordem de Terahertz. Para viabilizar a comunicação nessa frequência, praticamente tudo o que está a nossa volta tem que ser capaz de receber e transmitir sinais, então estamos falando de colocar materiais inteligentes em prédios, janelas, portas, mesas. É uma mudança de concepção. Um ambiente livre de células, a comunicação acontecendo livre de hierarquias e de arquitetura clássica. Tudo será parte da rede”, vislumbra.
E apesar de tudo isso parecer bastante surreal, a intenção é que com a maturidade da Rede 5G, que começa a ser implantada no país este ano, mas já funciona em várias partes do mundo, a migração para o 6G aconteça dentro de uma década. “O grande desafio da rede 6G será prover essa miscelânea de requisitos extremos ao mesmo tempo.
Para isso, a forma convencional de se pensar em uma rede não pode continuar existindo. Vamos fazer o uso não convencional da rede, portanto, formas não convencionais de estabelecer comunicação precisam ser desenvolvidas agora. Percebemos que são ideias extremamente futurísticas com o que estamos acostumados a ver hoje. É quase uma ficção científica. Esses são os passos que pretendemos dar nesses próximos 10 anos”, conclui o professor.