Um grupo de pesquisadores do Instituto Nacional de Telecomunicações – Inatel e do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP) apresentou um avanço que pode transformar a forma como se detectam moléculas essenciais para a saúde humana, como proteínas associadas a doenças neurológicas. Eles propuseram uma superfície óptica ultrassensível (metassuperfície) capaz de identificar até uma única molécula — que será um marco para técnicas de diagnóstico e monitoramento de doenças.
O estudo foi desenvolvido pelos professores William Orivaldo Faria Carvalho e Jorge Ricardo Mejía-Salazar, ambos do Inatel; pela estudante Ana Luísa Lyra Pavanelli, também do Instituto; e pelo professor Osvaldo Novais de Oliveira Junior, do IFSC/USP, sendo publicado na revista ACS Applied Materials & Interfaces.

Estudo aponta que metassuperfície desenvolvida é capaz de identificar até uma única molécula. Imagem retirada do artigo.
A pesquisa propõe uma estrutura composta por minúsculos discos feitos de camadas alternadas de metal e um material ferromagnético, sensível a campos magnéticos. Quando iluminados, esses discos produzem sinais extremamente precisos que mudam conforme o ambiente ao redor — inclusive quando moléculas se aproximam.
A importância de detectar moléculas quirais
Grande parte das moléculas fundamentais para a vida — como aminoácidos, proteínas e alguns tipos de medicamentos — possui uma característica chamada quiralidade. É como a diferença entre a mão direita e a esquerda: parecidas, porém impossíveis de sobrepor. Esse detalhe, apesar de sutil, pode determinar se um remédio é eficaz ou se uma proteína se comporta de maneira saudável ou prejudicial.
O problema é que identificar a quiralidade de moléculas em baixíssimas concentrações é extremamente difícil, já que as técnicas atuais exigem grandes quantidades de material, ou métodos complexos, caros e lentos. Quando os sensores propostos no artigo forem produzidos, o que pode ser feito com técnicas de nanofabricação existentes, o cenário se alterará.
Como funciona a tecnologia
A estrutura criada funciona como uma espécie de “tapete” nanoscópico formado por nanodiscos que interagem com a luz de forma altamente controlada. Ao aplicar um pequeno campo magnético, esses discos modificam a maneira como refletem diferentes tipos de luzes circularmente polarizadas. Se uma molécula quiral está presente, mesmo que seja apenas uma, a resposta dessas luzes muda. E muda o suficiente para que os pesquisadores possam medi-la com precisão inédita.
Segundo o estudo, esse sistema pode produzir sinais 20 vezes mais intensos que as técnicas tradicionais — uma diferença que permite detectar moléculas em concentrações que antes eram consideradas impossíveis.
A inovação abre caminho para vários avanços:
- Diagnósticos mais precoces, com a detecção de proteínas associadas a doenças como Parkinson ou Alzheimer muito antes dos sintomas surgirem;
- Análise de medicamentos, com a rápida verificação se um remédio está na forma correta (quiralidade certa), o que afeta sua eficácia e segurança;
- Monitoramento de biomoléculas, através do acompanhamento de processos biológicos em tempo real e sem a necessidade de marcadores fluorescentes.
Uma das demonstrações feitas pelos autores simula a detecção de moléculas semelhantes às fibrilas de α-sinucleína — proteínas cuja alteração de forma está ligada ao desenvolvimento de Parkinson.
Os pesquisadores também obtiveram a resposta esperada com diferentes quantidades de moléculas — desde quatro por unidade da superfície, até apenas uma. Mesmo no limite mínimo, o sinal ainda era suficientemente forte para ser detectado.
Em outras palavras, a tecnologia com a metassuperfície proposta alcançará o nível considerado como o “último degrau” para sensores ópticos – a detecção de uma única molécula.
Por que isso será revolucionário
Este novo tipo de sensor une vantagens raras de se ver juntas, quais sejam uma altíssima sensibilidade em tempo real para detectar moléculas sem marcadores, e com um equipamento compacto. A combinação desses fatores permitirá fabricar dispositivos mais baratos, portáteis e eficazes, o que pode democratizar tecnologias que hoje pertencem apenas a grandes laboratórios.
Da saúde para as telecomunicações
A pesquisa em colaboração entre o EMIS Lab - Electromagnetism and Intelligent Surfaces Laboratory do Inatel e o IFSC/USP em metassuperfícies vem sendo ampliada para diferentes áreas, uma vez que os princípios e materiais usados podem ser estendidos para qualquer aplicação em que se busque controlar ondas eletromagnéticas. Além da saúde, metassuperfícies são importantes para telecomunicações, já que elas oferecem uma forma nova de controlar ondas eletromagnéticas — incluindo a forma como os sinais de rádio, Wi-Fi, 5G e futuros sistemas 6G se propagam, se refletem e se focalizam no ambiente.
Essa importância está relacionada com diversas particularidades, como um controle preciso do sinal, em que as metassuperfícies permitem “moldar” o caminho que um sinal percorre. Isso significa que uma antena pode, por exemplo, direcionar um feixe exatamente para um receptor específico, reduzir interferências e aumentar o alcance. Por outro lado, elas permitem aumentar a capacidade das redes (essencial para 5G e 6G), pois com o enorme crescimento da utilização de dados as redes precisam transmitir mais informações entre milhares de dispositivos conectados.
Por último, as metassuperfícies promovem um menor consumo de energia. Como elas direcionam o sinal de forma mais precisa, as antenas precisam usar menos potência, o que reduz custos operacionais, diminui o aquecimento dos equipamentos e torna as redes mais sustentáveis.
Pesquisa no Inatel
A pesquisa integra o Programa de Pós-Graduação em Telecomunicações do Inatel e conta também com uma Iniciação Científica da graduação. A articulação entre diferentes etapas da formação acadêmica reforça o desenvolvimento de tecnologias e a continuidade das pesquisas no Instituto.
Referência nacional na formação de mestres e doutores em telecomunicações, o Programa mantém linhas de pesquisa alinhadas às demandas atuais e futuras do setor, envolvendo investigação científica, desenvolvimento tecnológico e projetos aplicados em parceria com empresas, agências de fomento e instituições internacionais.
A estrutura curricular e a participação em atividades de pesquisa permitem aos alunos atuar em temas como redes avançadas, sistemas de comunicação, optoeletrônica, segurança da informação e aplicações de inteligência artificial em soluções de conectividade. Nos últimos anos, o Programa de Mestrado e Doutorado ampliou sua produção acadêmica, fortaleceu a participação em redes de pesquisa e expandiu sua inserção internacional, com intercâmbios, publicações e presença crescente de estudantes de outros países.
Essa combinação entre formação técnica, pesquisa aplicada e colaboração institucional reforça o compromisso do Inatel com a capacitação de profissionais capazes de contribuir para o avanço da inovação e para o desenvolvimento do ecossistema de Telecomunicações no Brasil.
*com informações da Assessoria de Comunicação do IFSC/USP.






